O "sentimento" da melancolia parece inscrever-se numa constelação de afecções da alma que vão da tristeza à angústia, sem esquecer o tédio. Na medida em que pertence à esfera do "psicológico", há interferências entre esses três "estados da alma", em especial entre a tristeza e o tédio. A angústia, essa, é mais nítida. Menos indistinta, leva o ser à beira da própria negação. Mais não é, aliás, que a vida subtraída ao futuro, asfixiada por um presente sem dimensões. [...] De certa maneira, o anustiado tem excesso de vida e de impaciência; não compactua com o futuro nem projeta nele as cores da sua angústia. Ao contrário da melancolia, a angústia não comporta o "jogo" com o tempo - tudo é urgência, a própria memória fica como que em suspenso. O campo próprio da angústia é o da imaginação, imaginação do pior, em que o real fica de fora. O tédio, pelo contrário, remete-nos para o real, para o tempo, mas não para o jogo do tempo[...]. A realidade está a mais, e nós também. nâo precisamos pedir ao Tempo que suspenda seu vôo, como no poema em que a Melancolia romântica se encenou. Está já suspenso, ou melhor, roda invariavelmente em torno de si mesmo...
[Eduardo Lourenço - Mitologia da Saudade]
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